terça-feira, 5 de janeiro de 2010

A Centelha (Meister Eckart)


A Centelha

Uma nobre claridade brilha docemente em nós

e quer ser acolhida no lazer fiel (ledich seijn)

A pura centelha,

vida da vida de nossa alma,

que permanece unida à Fonte divina,

onde Deus faz brilhar sua luz eterna (sinen eweghen seijn)

Revelação no mais secreto de nós mesmos,

que nem razão nem sentido podem compreender

senão no amor nu:

eles são transformados (overformet), aqueles que a recebem,

sobrenaturalmente, da centelha íntima,

em um conhecimento divino simples.

O acidental e o múltiplo

nos retiram nossa simplicidade.

Como o diz são João o Evangelista,

esta luz brilha nas trevas

e sua claridade não é compreendida

pela obscuridade.

Se viessemos a esta claridade

diante de sua face, desocupados e livres

de todo modo, de toda coisa

que se aprende, se conta e se compõe,

no seio do abismo sem fundo

veríamos a luz na sua luz.

Rujam de terem mantido tanto tempo

vossa alma ocupada com o acidente,

ao nível da terra e privada de essência (onghewesent)

Se a simplicidade vos houvesse acostumado a ela mesma,

oculta em sua luz, vós seríeis libertos de formas e de imagens.

Deveis estar em grande erro

de buscar fora a luz em partes,

enquanto ela é toda em vós e vos libera totalmente.

Se quereis se tornar mestre

nesta filosofia, não afirmais:

deixeis toda coisa, com vós mesmos.

A! Deus, que nobreza

que esta livre vacuidade, onde o amor abandona amorosamente todo o resto

e não busca nada fora dele mesmo,

posto que em sua pura Unidade

abarca a eternidade bem-aventurada.

Hadewijch II



Estaríamos curados de toda enfermidade se estivessemos elevados e recolhidos, nus e destacados. Pois na centelha superior (gesterlîn), onde recebemos a claridade divina, não há jamais separação de Deus, nem qualquer intermediário.

Mestre Eckhart Sermão XVIII


Esta centelha recusa todas as criaturas e não vê nada além de Deus na sua nudez, tal qual é nele mesmo. Não lhe é suficiente nem o Pai nem o Filho, nem o Espírito Santo, nem as três Pessoas, na medida onde cada uma delas permanece em sua peculiaridade. Digo em verdade que a esta luz não basta a unicidade da natureza divina enquanto fecunda. Eu diria ainda o que daria um som mais estranho: o digo em verdade e eterna verdade e em perdurável verdade: a esta luz não basta o ser divino simples e impassível que não dá nem recebe; ela quer saber de onde vem este ser; ela quer penetrar no fundo simples, no deserto silencioso onde jamais distinção teve lugar, nem Pai nem Filho nem Espírito Santo, o mais íntimo on ninguém está em casa. É aí somente que esta luz encontra satisfação e aí ela é mais intimamente que ela é nela mesma, pois este fundo é um silêncio simples, imóvel nele mesmo, e por esta imobilidade todas as coisas são movidas, e são concebidas todas as vidas que os vivos dotados de intelecto são neles mesmos.

Mestre Eckhart

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